terça-feira, 30 de setembro de 2008

14 - A introdução da prospecção gravimétrica no SFM

Já muito disse, em posts anteriores sobre a minha persistente luta no sentido de ser introduzida, como prática corrente, no SFM, a prospecção pelo método gravimétrico.

Já referi e até foi publicado em 1955, no artigo “Prospecção de pirites no Baixo Alentejo” que todos os trabalhos de prospecção, dentro das áreas escolhidas para estudo pelo SFM, deveriam ser efectuados por técnicos portugueses que tivessem adquirido a necessária especialização, conforme previa o Decreto-lei de criação do SFM.

Referi, também, o caso inédito de ter vindo, por duas vezes, a Portugal, o Professor Bruckshaw do Imperial College of Science and Technology de Londres, como consultor, para industriar um Engenheiro do SFM na técnica gravimétrica!!

Apesar da minha insistência em todos os Planos Anuais de Trabalhos da Brigada do Sul, persistia a inércia da Direcção do SFM nesta matéria, sem justificação aceitável.

Entretanto, as Empresas estrangeiras (inglesa e belgas) concessionárias da exploração de pirite nas Minas de S. Domingos, Aljustrel e Louzal, estimuladas pelo êxito do SFM com a aplicação de técnica geofísica em Aljustrel, passaram todas a requerer ao Estado Português, autorizações para investigação de áreas envolventes das suas concessões, que estavam integradas na zona cativa para os estudos do SFM.

Enquanto o SFM não dispôs de gravímetros, estes requerimentos foram sempre deferidos, tendo-se imposto apenas a condição de apresentação periódica de relatórios sobre a natureza dos trabalhos efectuados e dos resultados conseguidos, cláusula contratual que era, por vezes, esquecida.

Quando alguns destes requerimentos chegavam à minha mão para informar, o que nem sempre acontecia, dava parecer favorável, pois interessava assegurar a exploração nas minas existentes, garantindo assim trabalho a muitos portugueses. Além disso, permitia-me manter contacto com técnicas novas, trazidas quer pelas empresas especializadas contratadas pelos concessionários, quer por professores universitários convidados como consultores.

Foi assim que vieram a Portugal os prestigiados Professores ingleses J. Bruckshaw, David Williams, John Webb, a “Compagnie Gènerale de Geophysique” francesa, Mc Phar canadiana e Lea Cross Geophysical Company inglesa.

Procurei sempre aproveitar estas presenças para tomar conhecimento prático das técnicas utilizadas, enquanto a Brigada dita de Prospecção Geofísica delas se mantinha desinteressada, continuando a manter em uso, durante mais de uma dezena de anos, apenas um magnetómetro, em prospecção da Faixa Magnetítica.

A Compagnie Gènérale de Géophysique demonstrou a eficácia da técnica gravimétrica na detecção de jazigos de pirite, ao evidenciar forte anomalia sobre as concentrações de Cerro do Carrasco e Moinho, em Aljustrel.

Deixou, além disso, uma pista para a descoberta da massa dos Feitais, que até já dera indicações da sua existência na concessão de manganés da Serra dos Feitais, atribuída a Alonso Gomes.

Chegou ao meu conhecimento que “Mines d’Aljustrel, S. A:” pretendeu negociar com Alonso Gomes o reconhecimento daqueles indícios de uma nova concentração de pirite, mas que as suas pretensões não tiverem êxito por Alonso Gomes não ter considerado aceitáveis as contrapartidas.

Quando, em 1960-61, a Lea Cross Geophysical Company estava actuando na Mina de S. Domingos, utilizando diversas técnicas com ênfase para a gravimetria e a análise geoquímica de Cu, Pb, Zn em amostras de solos, o seu Director solicitou-me a indicação de um Geólogo ou Engenheiro de Minas para colaborar nos seus trabalhos.

Logo me ocorreu que esta seria uma óptima oportunidade para que um Engenheiro que acabara de ser destacado para a BPG, e que estava condenado a ser mais um a juntar-se aos que se entretinham com a magnetometria, aprendesse as técnicas que a Lea Cross estava a usar.

Contactei este Engenheiro, perguntando-lhe se estaria interessado em fazer estágio junto da Lea Cross, fazendo-lhe ver que esta era a grande oportunidade da sua vida profissional que lhe era proporcionada.
Teria que ir viver, durante seis meses, na Mina de S. Domingos e submeter-se ao regime de trabalho da Lea Cross.

Começou por me revelar que não dominava a língua inglesa e isso constituiria obstáculo à sua aprendizagem. Óptimo, disse-lhe eu. Terá oportunidade de aprender não apenas técnicas de prospecção, mas também de aperfeiçoar o seu inglês.

Não mostrou o entusiasmo e pediu-me que eu esperasse pelo dia seguinte, pois queria consultar a sua mulher, professora de Matemática no Liceu de Beja, de quem teria que se separar durante os seis meses do seu estágio.

Quando no dia seguinte veio à minha presença, percebi pelo seu semblante que não estava disposto a aceitar a minha proposta, mas não lhe dei tempo a exprimir essa sua intenção. Disse-lhe, de chofre: Aceita, não é? E ele não teve coragem para dizer que não!
De imediato, elaborei uma proposta que apresentei ao Chefe da BPG, para que ele, se concordasse, a enviasse ao Director do SFM, como se tivesse sido de sua iniciativa, O Director do SFM, certamente pensando que a proposta era da iniciativa do Chefe da BPG, deu o seu acordo.

O estágio foi iniciado e teve o meu constante apoio.
Nas minhas frequentes deslocações à Secção de Moura e Barrancos para supervisão de importantes trabalhos de reconhecimento que decorriam na Mina de cobre de Aparis, fazia o meu regresso a Beja com passagem pela Mina de S. Domingos, para avaliar da evolução deste estágio.

Terminado o estágio, o Director do SFM aceitou, finalmente que fosse adquirido um gravímetro!!

Tinham passado 10 anos sobre a data da minha primeira referência à necessidade de aquisição deste aparelho!!!

Quando o gravímetro chegou, em 1962, a concessionária das Minas de Aljustrel tinha, desde 28-11-1961, uma das autorizações a que já aludi, para trabalhar em áreas contíguas à sua concessão, situadas no interior da área cativa para o SFM

“Mines d’Áljustrel S.A.” propusera-se prospectar, entre outras, uma área junto à concessão de manganés da Serra dos Feitais, onde já havia indícios sérios da existência de pirite.

Para a execução dos trabalhos de prospecção nas áreas que lhe foram adjudicadas, “Mines d’Aljustrel, S. A, “ firmou contrato com a “Lea Cross Geophysical Company”, que já tinha dado por terminada a sua campanha na região de S. Domingos.

Em resultado da actuação da Lea Cross, foi assinalada uma extraordinária anomalia gravimétrica (cerca de 1 mgal!), junto à concessão de manganés da Serra dos Feitais.

Com base nesta anomalia, foram efectuadas sondagens que evidenciaram concentração de pirite com dezenas de milhões de toneladas.

O Engenheiro ainda integrado na BPG, que, por minha iniciativa, fizera estágio na Mina de S. Domingos, em técnicas de prospecção geofísica e geoquímica, começou por me desiludir, quando se propunha deslocar-se a Aljustrel para solicitar aos técnicos da Lea Cross que lhe ajustassem o gravímetro para as latitudes do Sul do Pais onde estavam previstos trabalhos com este aparelho. Pedi-lhe o livro de instruções que devia acompanhar o aparelho e, em poucos minutos, resolvi o problema, apenas com uso de uma chave de fenda!

Para início da aplicação da gravimetria pela BPG, indiquei uma área da região de Montemor-o-Novo que incluía a mina da Herdade da Caieira, onde as investigações da BS tinham registado intensas anomalias electromagnéticas.

O objectivo era verificar se estas anomalias tinham apoio gravimétrico e, caso isso acontecesse, confirmar que nesta região poderiam existir jazigos de pirite idênticos aos da Faixa Piritosa Sul-Alentejana, hipótese já por mim exposta no relatório “Prospecção de Pirites no Baixo Alentejo” parcialmente publicado em 1955.

Constatei então, não haver na BPG técnicos preparados para efectuar os trabalhos de nivelamento geométrico rigoroso, indispensáveis às correcções que era necessário introduzir ás leituras do gravímetro, para chegar a valores que permitissem uma interpretação das anomalias da gravidade. Fui ainda eu a ensinar esses técnicos e outro pessoal a bem utilizar um nível que a Direcção do SFM tinha enviado muito desrectificado.

Na BS existiam já nessa data, não apenas técnicos com cursos superiores e médios aptos a bem trabalhar em topografia, mas também diverso pessoal assalariado que tinha sido adestrado por mim nesta técnica, dada a constante necessidade da sua aplicação. Todavia, para os nivelamentos exigidos pelos trabalhos mineiros, a seu cargo, era suficiente o nivelamento trigonométrico obtido com uso de taqueómetros.

Este levantamento gravimétrico não deu o apoio desejado, concluindo-se serem xistos negros carbonosos, com escassa disseminação de pirite, altamente condutores, os responsáveis pelas anomalias electromagnéticas.

Pouco tempo após a execução desta campanha, ocorreram alterações profundas na organização do SFM, uma das quais foi a extinção da BPG e a criação de um novo departamento extensivo a todo o território nacional, no qual ficaram integrados, entre outros, os trabalhos de geologia e de prospecção mineira. Este departamento, denominado 1.º Serviço ficou a meu cargo, tendo eu passado a ter residência no Porto, onde se situava a sede do SFM.

A esta nova organização e às suas consequências, já anunciadas no post sobre os grandes êxitos do SFM me referirei oportunamente.

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