quarta-feira, 29 de outubro de 2008

22 – Projecto de prospecção aérea no Alentejo

Este foi mais um projecto que apresentei, e que tinha o apoio da OCDE, que se frustrou pela acção de dirigentes pouco empenhados na concretização dos objectivos do SFM.

Em Agosto de 1961, quando eu ainda chefiava a Brigada do Sul do SFM, fui nomeado por despacho da Director-Geral de Minas, Engenheiro Luís de Castro e Solla, para representar o País, em reuniões de um Grupo “ad hoc” sobre o tema “Métodos modernos de prospecção” que teriam lugar em Paris nos dias 11 e 12 de Setembro do mesmo ano.

Foi com alguma surpresa que tomei conhecimento desta nomeação, porquanto se mantinha ainda em vigor uma Brigada denominada de Prospecção Geofísica, e era suposto que de prospecção geofísica se fosse tratar.

De facto, o objectivo das reuniões era preparar especialistas em métodos modernos de prospecção que pudessem dar correcta execução a projectos de investigação dos recursos minerais dos países da OCDE.

A OCDE propunha-se participar financeiramente na execução destes projectos, considerando a necessidade de encontrar novas fontes de matérias-primas.

Desempenhei-me da missão com muito agrado e, quando o Presidente às Reuniões me concedeu a palavra, estando presentes representantes de 18 países, tive oportunidade de revelar que Portugal havia criado, em 1939, um Organismo estatal destinado à inventariação dos seus recursos minerais e que até já obtivera notáveis êxitos através da aplicação de métodos geofísicos.
Citei, como exemplos, os casos de Carrasco-Moínho em Aljustrel e Aparis em Barrancos pela aplicação do método electromagnético.

Na sequência destas reuniões, apresentei, em Maio de 1962, ante-projecto de prospecção aérea sobre o Alentejo.

A seguir transcrevo, traduzindo do francês original para português, excertos deste ante-projecto:

“Na parte Sul de Portugal há sobretudo jazigos de pirite, manganés, cobre e ferro.
A pirite está associada com formações porfíricas e forma geralmente grandes massas que se situam numa faixa que atravessa o País numa direcção NW, desde a fronteira com a Espanha perto da Mina de S. Domingos até ao Oceano Atlântico.
Esta faixa é a continuação em Portugal da Faixa Piritosa Espanhola.
Em Portugal, são conhecidos 6 jazigos, quatro dos quais estão actualmente em exploração.
Admite-se que outros possam existir.
Para os encontrar, foram já feitos levantamentos geofísicos sobre o terreno, cobrindo uma parte considerável da faixa portuguesa.
Empregou-se, sobretudo, o método electromagnético Turam.
Os métodos de polarização espontânea, de resistividade, potenciométricos, electromagnéticos (espira vertical), gravimétrico, magnéticos e geoquímico (para o cobre e para o chumbo) foram também utilizados, mas em pequena escala.
Este trabalho está ainda em curso de execução.
Até ao presente, apenas se descobriu uma massa de pirite, mas considera-se que subsistem as possibilidades de existência de outras massas.
Actualmente, as zonas mais interessantes são as que ainda não foram prospectadas por método algum.
Em primeiro lugar colocamos a zona entre as Minas de Aljustrel e do Louzal, que tem uma cobertura de terrenos terciários de uma profundidade variável, mas que, em alguns locais, ultrapassa 100 metros, a qual tem uma alta condutividade que torna difícil a interpretação dos resultados dos métodos eléctricos.
Estes sedimentos, que formam a Bacia Terciária do Rio Sado, estendem-se também para o Norte e nós admitimos que eles escondem formações porfíricas, com as quais podem estar associadas massas de pirite.
Um ambiente geológico análogo ao da Faixa Piritosa, perto de Alcácer do Sal, com afloramentos de pórfiros e de outras rochas eruptivas e de jaspes com mineralizações manganíferas associadas, dá consistência a esta hipótese.
Não sabemos se há já algum método suficientemente desenvolvido para detectar jazigos de pirite sob uma cobertura tão espessa e condutora como a da bacia do Rio Sado.

Outras zonas que nós consideramos com possibilidades para jazigos de sulfuretos são as seguintes:
Região de Cercal-Odemira, onde mineralizações de ferro e manganés associadas a formações porfíricas são já conhecidas;
Grande região de pórfiros, entre Montemor-o-Novo e Serpa:
Todas as zonas da Faixa Piritosa já prospectadas pelo método Turam, porque este método não pode considerar-se eliminatório, sobretudo para profundidades de investigação ultrapassando, em geral, 50 metros, nas condições geológicas da Faixa Piritosa.
O manganés encontra-se nas mesmas condições geológicas da pirite, sob a forma de carbonatos, silicatos e óxidos, em associação com jaspes. Conhecem-se numerosas ocorrências destes minérios, mas poucos jazigos exploráveis. Em muitos casos, há uma pequena percentagem de magnetite, quer nos jaspes, quer nos minérios.

O cobre encontra-se sobretudo sob a forma de calcopirite e seus produtos de alteração, em filões que se situam em formações geológicas variadas.

O ferro apresenta-se geralmente sob a forma de magnetite. Os seus jazigos situam-se “grosso-modo” numa faixa paralela á Faixa Piritosa, que se alonga desde as imediações de Montemor-o-Novo até à fronteira, perto de Moura.
Não temos elementos que nos permitam ajuizar se esta Faixa continua em Espanha. Haveria interesse em estudar esta questão.
Presentemente há apenas um jazigo de magnetite em exploração.
Para encontrar outros que mereçam exploração, cuja existência se crê possível, têm sido feitos levantamentos magnéticos, à superfície, numa parcela importante da Faixa.
Os resultados já obtidos oferecem um certo interesse.
Todavia, há ainda uma extensa zona a estudar, com problemas difíceis de resolver por este método, com observações no solo, devido a pequenas concentrações de magnetite sem interesse económico que se encontram perto da superfície e que, interpondo-se, podem mascarar a influência de massas importantes que eventualmente se encontrem em profundidade.

Acreditamos que um levantamento aéreo, pelos métodos magnético, electromagnético, gravimétrico e talvez radiométrico (se a Junta de Energia Nuclear nisso revelar interesse) cobrindo a área indicada na carta mineira deveria ser considerado, a fim de contribuir para uma mais rápida solução dos problemas enunciados.”

Este ante-projecto incluía um extracto da Carta geológica do Sul de Portugal (a Sul do Rio Tejo), à escala de 1:500 000 e um extracto da carta mineira da mesma área, à mesma escala.

Foi tão boa a aceitação do ante-projecto que a OCDE decidiu considerar a sua extensão ao Sul de Espanha.

Entretanto, ocorreram na Direcção-Geral de Minas alguns acontecimentos que vieram alterar a sequência do ante-projecto.

No segundo semestre de 1962, o Engenheiro Luís de Castro e Solla pediu a exoneração do cargo de Director-Geral de Minas (facto a que oportunamente me referirei mais detalhadamente, pelo seu ineditismo), indicando para o substituir o Engenheiro Fernando Soares Carneiro.

O novo Director-Geral, sem me dar qualquer explicação, nomeou, em Maio de 1963, como representante de Portugal no Grupo de Trabalho da OCDE para a prospecção mineira, o Engenheiro que acabara de deixar o cargo de Director do SFM, no qual se mantivera durante 15 anos.

A experiência deste Engenheiro em prospecção mineira era nula.

Isso se reflectiu, em contactos posteriores com representantes da OCDE vindos a Portugal para reuniões tendo em vista a concretização da prospecção aérea no Sul de Portugal e Espanha.

Numa dessas reuniões, que teve lugar em Lisboa, com presença do Director-Geral de Minas, de um seu Adjunto (o cognominado Ajax), do representante português da OCDE e do dirigente máximo do Grupo de Trabalho da OCDE vindo propositadamente de Paris, foi pedida a minha participação, como elemento mais conhecedor do tema, de que fora autor.

Senti-me tão mal impressionado com a falta de empenhamento dos principais representantes da Direcção-Geral de Minas e com as atitudes grosseiras do novo Director-Geral, que logo me apercebi de que o projecto se iria gorar.

E foi o que aconteceu. Não mais ouvi falar dele!

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