quarta-feira, 15 de julho de 2009

81 – A minha demissão da chefia da 1.ª Brigada de Prospecção

A partir de 11 de Janeiro de 1975, começaram a circular, na sede do SFM, em S. Mamede de Infesta, rumores de que o Director tinha recebido um documento subscrito por todos os funcionários contratados da 1.ª Brigada de Prospecção, residentes na sede em Beja e nas Secções de Vila Viçosa, Évora, Ferreira do Alentejo e Castro Verde, no qual me eram feitas gravíssimas acusações.
Estes rumores, vindos de diversas fontes, começaram a adquirir grande consistência, pelos comentários que suscitavam, os quais chegavam a classificar o documento de repugnante.
Era geral a surpresa, perante o meu bem conhecido bom relacionamento com todos esses funcionários, e até amizade com vários deles, sedimentada durante dezenas de anos de são convívio e os elogios que não regateavam, quando a mim se referiam.
Isto ainda hoje pode ser confirmado, quer por testemunhas, quer por correspondência que conservo.
Dentre esses rumores, destacavam-se alguns que se apoiavam em informação do próprio Director do SFM.
Embora me custasse acreditar, a realidade é que, como relatei em posts anteriores, já havia sérios indícios da mudança de comportamento para comigo, desde a data da minha recusa de visar boletins itinerários fraudulentos, que obedeciam à “regra dos 70%” aconselhada pelo Director-Geral.
Os dias, porém, iam passando e o documento mantinha-se na mão do Director, sem que do seu conteúdo eu fosse informado.
Era do conhecimento geral que as minhas relações com o Director do SFM nunca tinham sido muito cordiais.
O seu débil carácter obrigara-me a oficializar todas as decisões de trabalho, que me tivessem sido transmitidas oralmente ou em manuscritos sem entrada na secretaria.
A excessiva demora, que estava a verificar-se, em dar a devida sequência à exposição que referi, causava-me profunda estranheza, embora fosse característica do Director a retenção de documentos na sua mão, por longo tempo, sem lhes dar despacho. Alguns deles, quando os interessados reclamavam resposta, eram-me remetidos para informação, que eu geralmente prestava em escassos minutos.
Pensava eu que o Director estaria a ponderar as três saídas que se lhe deparavam, para se desembaraçar do problema que enfrentava.
A primeira seria confrontar os subscritores do famigerado documento com a gravidade das suas afirmações, que os tornava incursos em procedimento disciplinar, de previsíveis consequências, perante a total falta de fundamento das afirmações produzidas e a sua óbvia correlação com a minha recusa em apor o meu visto em boletins itinerários fraudulentos, uma vez que só o pessoal afectado pela Ordem de Serviço N.º 613 o subscrevia, não se tendo associado a grande maioria do pessoal da Brigada (os assalariados) que por tal Ordem não era atingida.
A segunda seria o envio da exposição para o Organismo expressamente criado pelo Governo para as denúncias de erros cometidos por funcionários que prejudicavam a economia nacional (constava que essa era uma das muitas acusações que me eram feitas).
A terceira seria a instauração de um inquérito interno para averiguar a veracidade das acusações, no qual me seria dada a possibilidade de defesa, como seria normal, em regime democrático.
Chegou-se a 22 de Janeiro, sem que me tivesse sido dado conhecimento do documento acusatório a que tenho vindo a referir-me.
Entretanto, na 1.ª Brigada de Prospecção estavam a verificar-se os actos de indisciplina a que aludi no post anterior, que me tinham levado a emitir ordens para lhes pôr cobro. Fui levado a concluir que tais actos pretendiam demonstrar que a minha autoridade como Chefe da Brigada já estava posta em causa, com cobertura superior.
Considerando intolerável a manutenção de tal indisciplina, resolvi endereçar ao Director, ofício, informando-o pretender enviar à Comissão de Saneamento uma terceira exposição a juntar a duas outras, nas quais tinha pedido inquérito aos seus actos e aos do Director-Geral.
A esta nova exposição, era meu propósito anexar o documento vindo de Beja, pois a Comissão de Saneamento era o Organismo propositadamente criado para analisar acusações do género das que me tinham sido feitas e introduzir as correcções que certamente se pretendiam.
Solicitei, por isso, que me fossem enviadas 3 cópias da exposição que sabia existir. O ofício foi enviado com Nota de Remessa para eu ficar com documento comprovativo de ter sido recebido.

Em 25-1-1975, o Director do SFM enviou-me o seu despacho, que a seguir transcrevo:

EXPOSIÇÃO DE 8 DE JANEIRO DE 1975 DO PESSOAL CONTRATADO DA 1.ª BRIGADA DE PROSPECÇÃO. ADITAMENTO ENVIADO PELO MESMO PESSOAL EM 22 DE JANEIRO DE 1975
Despacho:
Atendendo a que:
1 – Todo o pessoal contratado da 1.ª Brigada de Prospecção, sem qualquer excepção (engenheiros, geólogos, agentes técnicos de engenharia, colectores, auxiliares de campo, ajudante de desenhador e motorista) subscreve a presente exposição,
2 – Nesta exposição se afirma, relativamente ao Chefe do 1.º Serviço, Eng.º Albertino Adélio Rocha Gomes, que, pelos motivos nela referidos, o pessoal contratado da 1.ª Brigada de Prospecção sente “que não mais poderá continuar a trabalhar sob as suas ordens e pede, por decisão unânime, a sua substituição imediata do cargo de Chefe da 1.ª Brigada de Prospecção e que seja revista superiormente a sua qualidade de Chefe do 1.º Serviço.”
3 – Em reunião com diversos elementos da 1.ª Brigada foi por estes mantida, com firmeza, a recusa em trabalhar sob a chefia do Eng.º Rocha Gomes,
4 – Está em curso a reestruturação da Secretaria de Estado da Indústria e Energia, reestruturação que abrange a Direcção-Geral de Minas e Serviços Geológicos e consequentemente o Serviço de Fomento Mineiro, e que com a sua concretização certamente se encontrará solução para o problema,
5 – O Eng.º Rocha Gomes enviou à Comissão de Saneamento do Ministério da Economia exposição em que, tudo o deixa acreditar, faz acusações ao Director do Serviço, o que leva este a não querer tomar nem propor decisões drásticas nem definitivas que poderiam ser mal interpretadas.
6 – Mas a que é absolutamente imprescindível garantir o regular funcionamento da 1.ª Brigada de Prospecção, pois os trabalhos em curso não podem parar nem sofrer quebra sensível,

Determina-se, a título provisório, e enquanto se aguarda solução definitiva:
a) – Que a 1.ª Brigada de Prospecção seja desligada do 1.º Serviço, ficando na dependência directa do Director do Serviço de Fomento Mineiro
b) - Que, de acordo com o proposto pelo pessoal contratado da Brigada, esta seja orientada por uma Comissão Directiva constituída pelos Senhores Eng.º Vítor Velez Pereira Borralho, Dr. Delfim de Carvalho e Agente Técnico de Engenharia Manuel Virgínio Ferreira Camarinhas.
c) - Que ao Chefe do 1.º Serviço sejam enviados todos os relatórios elaborados pela 1.ª Brigada de Prospecção. Poderá assim manter-se ao corrente dos trabalhos em curso, prestar ao Director do Serviço as informações que lhe solicitar e colaborar com a sua experiência e conhecimentos, no planeamento dos trabalhos a realizar a sul do Tejo.

Dadas as consequências que podem resultar para o Serviço de Fomento Mineiro de todo este caso, dá-se conhecimento da exposição do pessoal da 1.ª Brigada de Prospecção, seu aditamento e do presente despacho ao Senhor Director-Geral de Minas e Serviços Geológicos habilitando-o, deste modo, a tomar as decisões que julgar convenientes.

SERVIÇO DE FOMENTO MINEIRO, em S. Mamede de Infesta, 24 de Janeiro de 1975
O ENGENHEIRO DIRECTOR
(a) N.A.M.Q

Nenhuma das hipóteses que eu tinha considerado se verificou. O Director aceitou as reivindicações do pessoal contratado da 1.ª Brigada de Prospecção residente em Beja, Vila Viçosa, Ferreira do Alentejo e Castro Verde, sem me dar conhecimento dos fundamentos de tais reivindicações.
O seu despacho revela uma ousadia característica da ignorância. Colocar, sob sua directa orientação, um departamento com a importância da 1.ª Brigada de Prospecção, significava deixar esta Brigada sem orientação, perante a sua total impreparação nas técnicas lá aplicadas.
O facto de determinar que a Brigada continuasse a enviar-me relatórios para que eu pudesse auxiliá-lo, com a minha experiência e conhecimentos, no planeamento dos trabalhos a realizar a sul do Rio Tejo, está em flagrante contradição com a decisão de me demitir da chefia da Brigada.
Obviamente que esta determinação não iria ser cumprida. E foi o que acabou por acontecer, com os resultados que oportunamente irei descrever.

Continua

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