sábado, 22 de maio de 2010

124 – As realidades e as fantasias do Director-Geral de Minas. Continuação 5

Para concluir a análise da Comunicação do Director-Geral de Minas ao Congresso 78, vou referir a sua acção destrutiva na obra que eu estava pacientemente a pôr em prática, para cumprimento do programa enunciado no meu relatório “Prospecção de Pirites no Baixo Alentejo” publicado em 1955.

A seguir reproduzo passagens desse relatório, que ele tinha obrigação de ter tido em consideração, antes de tomar as suas irreflectidas e talvez inconscientes decisões:

Todos os estudos a que nos vimos referindo podem e devem, em nosso entender, estar a cargo de técnicos portugueses que hajam, para o efeito, adquirido a necessária especialização, conforme prevê o Decreto-lei de criação do Serviço.
Só aceitamos a intervenção de técnicos de outras nacionalidades, como consultores ou em execução de campanhas de curta duração, principalmente com o propósito de proporcionar instrução a pessoal português.
A favor deste modo de proceder falam, não só a economia, como o próprio interesse no assunto, que não poderá esperar-se de outros, superiores ao dos nacionais.
Ainda que fosse inviável, ou desaconselhada por demasiado especializada, a execução directa pelo Serviço de determinados estudos, o que não cremos possa vir a acontecer, porquanto o Ultramar é vasto campo onde a especialização adquirida teria sempre ocasião de frutificar, é indispensável para uma eficiente fiscalização, um amplo conhecimento das matérias a fiscalizar.”

Quando iniciei a minha vida profissional, na Faixa Piritosa Alentejana, surpreendeu-me que todas as concessões mineiras, em tão importante Faixa, estivessem em mãos estrangeiras.

Havia, então, indústrias nacionais que utilizavam a matéria-prima extraída em algumas dessas minas, para a fabricação de produtos vários, tais como, enxofre, cobre, sulfato de cobre. e uma das razões que tinham levado o primeiro Director do SFM a procurar aumentar as reservas de pirite era o receio de que viesse a verificar-se escassez de matéria-prima para as abastecer.

Não percebi porém, porque tendo o País sido capaz de criar tais indústrias e ter em projecto uma Siderurgia Nacional, necessitasse que fossem estrangeiros a explorar os minérios de que elas dependiam.

Vinham à minha memória os versos de Camões, na última estância do Canto X dos Lusíadas, dirigindo-se ao Rei, a quem dedicava o poema:

“Fazei, Senhor, que nunca os admirados
Alemães, Galos, Ítalos e Ingleses
Possam dizer que são para mandados
Mais que para mandar os Portugueses”

De facto, o Director-Geral não se limitou a impedir que se iniciassem estudos em áreas do Norte e do Centro do País, com reais potencialidades, para volfrâmio, estanho, ouro, chumbo, zinco, etc.

Resolveu perturbar o programa de investigação da Faixa Piritosa Alentejana, desrespeitando a orientação expressa no Decreto-lei de criação do SFM, que previa a maior intervenção de técnicos portugueses no aproveitamento dos nossos recursos.

Sem me consultar, deliberou adjudicar a prospecção de quase toda a Faixa, sobretudo a Companhias estrangeiras, precisamente quando o SFM, após a minha persistente luta contra a incompreensão de dirigentes (Ver post n.º 14) conseguira equipar-se minimamente, para a execução do programa enunciado no relatório.

Apenas ficou por adjudicar uma diminuta parcela que envolvia as concessões belgas de Aljustrel, onde o SFM tinha descoberto as massas de Carrasco-Moinho pelo método Turam, as massas de Estação e Gavião pelo método gravimétrico e confirmado a vigorosa expressão gravimétrica das massas de Feitais e Carrasco - Moinho.

Mas até esta parcela o Director-Geral resolveu adjudicar, quando o SFM se preparava para confirmar por sondagens a massa do Gavião.

Curiosa a precipitação na entrega desta parcela à Companhia, cujo representante “simbólico” da DGMSG era o Ajax, que, nessa qualidade, tinha nula intervenção, por ser ignorante em prospecção mineira, conforme assinalei, no post n.º 32.

A situação extraordinária que se gerou foi inversa da que seria normal: O SFM passou a funcionar como empresa especializada em prospecção mineira e a ser contratado pelas empresas privadas, como se elas fossem as proprietárias do território nacional.

A orientação da minha actividade sempre teve em vista respeitar os preceitos consignados nas disposições do Decreto-lei de criação do SFM.
Os técnicos portugueses deveriam, pois, vir progressivamente a encarregar-se não só da exploração dos novos jazigos que viessem a ser revelados, mas também dos procedimentos para o aproveitamento integral dos seus minérios.

A Escola de Aparis seria o local apropriado para a preparação desses técnicos.

E já existiam, há mais de 20 anos, completamente inactivos, na sede do SFM, em S. Mamede de Infesta, os equipamentos para a separação e concentração dos minerais constitutivos do minério e para o seu posterior tratamento metalúrgico, que haviam sido recebidos ao abrigo do Plano Marshall! (Ver post n.º 15)

Não posso deixar de salientar a enorme hipocrisia e o despudor do Director-Geral ao procurar desculpabilizar-se, com expressões propositadamente vagas, cujo alcance poucos terão atingido, quando fez as seguintes afirmações:

“Assim, e como era de esperar, os maiores sucessos de uns no campo da prospecção dos últimos tempos (sucessos espectaculares, por vezes) quase sempre aproveitaram, se não mesmo se basearam em dados acumulados em projectos de prospecção de outros, não ultimados por razões de vária ordem, nem sempre determinados pela natureza negativista dos resultados da verificação do modelo em estudo."

Os sucessos espectaculares a que pretendia referir-se eram as descobertas do jazigo de Neves-Corvo e da massa do Gavião, que não foram concretizados até final pelo SFM, devido à sua nefasta intervenção, como já expliquei em vários posts anteriores.

Estes sucessos basearam-se em dados não de outros, como afirma, mas exclusivamente do SFM, e ele tinha obrigação de isso saber e realçar, se tivesse acompanhado, com seriedade e não levianamente, a actividade do SFM, já que se substituira ao subserviente Director deste Organismo, nas suas importantes funções.

Tais sucessos não foram ultimados por razões de vária ordem. Não foram ultimados pelo SFM, porque, quando a anomalia gravimétrica que iria dar origem à descoberta do jazigo de Neves-Corvo estava semi-definida, ele decidiu, sem me consultar fazer a adjudicação da área em que ele se havia começado a definir (Ver posts n.ºs 37 a 44)

Sabendo-se que eu não fazia segredo da nossa actividade, por ela estar protegida pela cativação da área, e conhecendo-se o carácter pouco escrupuloso tanto do Director-Geral como do seu Adjunto, que era o representante da DGMSG numa das Companhias que formavam o Sindicato ao qual foi feita a adjudicação, sem concurso público e com a maior das precipitações, muitas conjecturas são possíveis.

Isto trouxe como consequência, não só a perda de uma rara oportunidade de o País passar finalmente a aproveitar ele-próprio os seus recursos, como era justo ambicionar, mas também um atraso de pelo menos 5 anos na sua descoberta!

Seria normal que, quando se passasse à exploração, houvesse que recorrer a empresas especializadas estrangeiras para determinados trabalhos, mas isso era também o que faziam os concessionários estrangeiros que se encontravam no nosso País, como já pus em evidêncvia em vários posts, salientando o muito que aprendi com essas empresas.

Comentário final: Classifiquei esta infeliz Comunicação como o “Canto do Cisne” de um Director-Geral, já muito desprestigiado.
Não era difícil de prever que estava próximo o fim do seu mandato.
Mas ainda teria fôlego para novas escandalosas acções negativas, como revelarei em futuro post.

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