quinta-feira, 14 de junho de 2012

200 – Novo Plano Mineiro Nacional. Continuação 24, Referência especial à Região de Montemor-o-Novo

A prospecção mineira, no seu conceito lato, inclui todos os estudos, que visem a definição de reservas de recursos minerais, para futura exploração e comercialização.

Seguindo este conceito, que deduzi ter sido adoptado por José Goinhas, no documento sobre a história da "Prospecção Mineira em Portugal", que tenho vindo a analisar, cheguei, nesta análise, à fase final, caracterizada pela execução de trabalhos mineiros desenvolvidos.

Com base nos elementos constantes dos relatórios anuais, publicados até 1964, salientei que a acção das Brigadas do SFM, do Norte e do Centro, desde a criação do Serviço, conduziu, unicamente, à definição de reservas significativas, no jazigo de ferro de Guadramil e a exploração, por empresa privada, no jazigo de chumbo argentífero de Terramonte.

Vou agora referir-me à actividade da Brigada do Sul no mesmo período.

A região de Montemor-o-Novo foi a seleccionada para os primeiros estudos.
As publicações nºs 3 e 15 da série “Relatórios” dão conta dos trabalhos efectuados nas minas de ferro existentes nesse concelho e dos respectivos resultados.

Da Introdução do relatório de 123 páginas e 39 peças desenhadas, subscrito por um Engenheiro, um Geólogo e dois Agentes Técnicos de Engenharia, que foi publicado em 1949, com o N.º 15, destaco as seguintes passagens:

“Com a designação “Minas de Ferro de Montemor-o-Novo”, incluímos o conjunto de minas, situadas neste concelho, constituindo a faixa mineralizada de cerca de 12 quilómetros, que se estende desde a Herdade da Nogueirinha, a sudeste, até à Herdade da Gamela, a noroeste”

“Algumas destas minas foram largamente exploradas, como se verá no decorrer deste relatório, tanto em tempos bastante remotos, como há uma dezena de anos a esta data; outras não apresentam quaisquer trabalhos.
Circunstâncias umas vezes de ordem técnica e outras de ordem económica conduziram estas minas a uma exploração pouco regular e intermitente.
O estado actual dos trabalhos e os estudos realizados levam-nos à desoladora conclusão de que as massas importantes deste jazigo foram extraídas, apenas restando pequenas tonelagens dispersas com minério de qualidade inferior ao extraído.”

Do capítulo “Conclusões” destaco:

“Os autores de alguns relatórios antigos admitem a possibilidade de o jazigo se prolongar em profundidade sob a forma de pirite. Para nós, as condições genéticas do jazigo e as observações feitas em profundidade, principalmente para o grupo sudeste da faixa mineralizada, são suficientes para excluir esta hipótese.”

Não sei o que mais me surpreendeu:
... se, em completo desrespeito por disposições legais em vigor, se ter permitido a manutenção, por empresa privada, de concessões mineiras, nas quais o SFM, após estudos que realizou, ter declarado não existirem concentrações de minério que justifiquem exploração;
... se a escolha, para publicação, de um relatório, com conclusões negativas, que não era obviamente estimulante para novos estudos por empresas mineiras.

O mesmo Director do SFM, o Engenheiro Guimarães dos Santos, viria, poucos anos mais tarde, a manter sem publicação, vários relatórios de minha autoria, nos quais eram apresentados resultados positivos, de muito interesse.
Só por intervenção do Director-Geral, Engenheiro Castro e Solla, quando lhe dei conhecimento desse facto insólito, é que Guimarães dos Santos decidiu publicar alguns dos meus relatórios, seleccionando, porém, para o efeito, os que tinham menos páginas e peças desenhadas e, mantendo os principais em arquivo.
Aconteceu que a publicação de um desses relatórios logo suscitou o interesse de Companhia estrangeira para celebrar contrato com o Estado, visando dar continuidade aos estudos que o SFM não tinha podido completar por não dispor, então, dos equipamentos necessários. (Ver post N.º 3)

A óbvia realidade é que as conclusões a que chegaram os 4 autores da publicação N.º 15 da série “Relatórios”, não podem ser levadas a sério.

Todos aqueles autores eram técnicos recém-formados, até com baixas classificações nos seus cursos, portanto sem experiência profissional e com pouca capacidade para a terem adquirido durante os anos em que participaram nos estudos destas Minas.

De facto, tratando-se de um jazigo com a extensão de 12 km, seria natural formular a hipótese de que também atingisse grande profundidade.

A zona onde o concessionário fez exploração e onde o SFM procedeu principalmente a desobstruções e a amostragens de minério não extraído pelo concessionário, devido à sua inferior qualidade, seria a parte superior de um jazigo de enormes dimensões, que conteria, não apenas magnetite, mas provavelmente também sulfuretos vários.

A parcela conhecida seria o que, em linguagem corrente se exprimiria por “ponta de um iceberg”.

O primeiro Director do SFM, o Engenheiro António Bernardo Ferreira, apercebendo-se desta possibilidade, promoveu que fosse empreendida campanha de prospecção, pelo método magnético, para localizar concentrações de minério ocultas.
A campanha esteve a cargo da Companhia sueca ABEM, mas não conduziu a resultados com interesse.
A abundância de magnetite, à superfície, derivada das explorações, provocava anomalias que mascaravam efeitos provenientes de possíveis concentrações profundas.

Quando, em 1948, passei a dirigir a Brigada do Sul, uma área que, de imediato, mereceu a minha atenção, foi a que passei a denominar de Faixa Magnetítica, onde ocorrem os conhecidos jazigos de Montemor-o-Novo, Alvito, Orada e outros de menor importância.

Alguns anos mais tarde, fui induzido a alterar a designação para “Faixa Magnetítica e Zincífera”, por ter reconhecido que, no mesmo ambiente geológico, ocorriam também mineralizações de sulfuretos, sobretudo de zinco, constituindo horizonte mineralizado idêntico à Faixa Piritosa, situada mais a sul. (Ver posts N.ºs 8, 12 e 19).

Em 1961, foi-me dada uma extraordinária oportunidade de resolver o problema ocasionado pela abundância de magnetite à superfície.

Eu tinha sido nomeado para representar Portugal, em reuniões em Paris, por um Grupo de técnicos de 18 países, constituído “ad hoc”, no âmbito da OCDE, para aplicação de métodos modernos de prospecção
Na sequência destas reuniões, apresentei um ante-projecto de prospecção aérea no Alentejo. (Ver posts N.ºs 4 e 22).

A seguir, transcrevo, o que escrevi, a este respeito no post N.º 22

“O ferro apresenta-se geralmente sob a forma de magnetite. Os seus jazigos situam-se “grosso-modo” numa faixa paralela á Faixa Piritosa, que se alonga desde as imediações de Montemor-o-Novo até à fronteira, perto de Moura.
Não temos elementos que nos permitam ajuizar se esta Faixa continua em Espanha. Haveria interesse em estudar esta questão.
Presentemente há apenas um jazigo de magnetite em exploração.
Para encontrar outros que mereçam exploração, cuja existência se crê possível, têm sido feitos levantamentos magnéticos, à superfície, numa parcela importante da Faixa.
Os resultados já obtidos oferecem um certo interesse.
Todavia, há ainda uma extensa zona a estudar, com problemas difíceis de resolver por este método, com observações no solo, devido a pequenas concentrações de magnetite sem interesse económico que se encontram perto da superfície e que, interpondo-se, podem mascarar a influência de massas importantes que eventualmente se encontrem em profundidade.

Acreditamos que um levantamento aéreo, pelos métodos magnético, electromagnético, gravimétrico e talvez radiométrico (se a Junta de Energia Nuclear nisso revelar interesse) cobrindo a área indicada na carta mineira, deveria ser considerado, a fim de contribuir para uma mais rápida solução dos problemas enunciados.”

Este ante-projecto incluía um extracto da Carta geológica do Sul de Portugal (a Sul do Rio Tejo), à escala de 1:500 000 e um extracto da carta mineira da mesma área, à mesma escala.

Foi tão boa a aceitação do ante-projecto que a OCDE decidiu considerar a sua extensão ao Sul de Espanha.

Entretanto, ocorreram na Direcção-Geral de Minas alguns acontecimentos que vieram alterar a sequência do ante-projecto.

No segundo semestre de 1962, o Engenheiro Luís de Castro e Solla pediu a exoneração do cargo de Director-Geral de Minas (facto a que oportunamente me referirei mais detalhadamente, pelo seu ineditismo), indicando para o substituir o Engenheiro Fernando Soares Carneiro.

O novo Director-Geral, sem me dar qualquer explicação, nomeou, em Maio de 1963, como representante de Portugal no Grupo de Trabalho da OCDE para a prospecção mineira, o Engenheiro que acabara de deixar o cargo de Director do SFM, no qual se mantivera durante 15 anos.

A experiência deste Engenheiro em prospecção mineira era nula.

Isso se reflectiu, em contactos posteriores com representantes da OCDE vindos a Portugal para reuniões tendo em vista a concretização da prospecção aérea no Sul de Portugal e Espanha.

Numa dessas reuniões, que teve lugar em Lisboa, com presença do Director-Geral de Minas, de um seu Adjunto (o cognominado Ajax), dos representantes portugueses da OCDE e do dirigente máximo do Grupo de Trabalho da OCDE, vindo propositadamente de Paris, foi pedida a minha participação, como elemento mais conhecedor do tema, de que fora autor.

Senti-me tão mal impressionado com a falta de empenhamento dos principais representantes da Direcção-Geral de Minas e com as atitudes grosseiras do novo Director-Geral, que logo me apercebi de que o projecto se iria gorar.

E foi o que aconteceu. Não mais ouvi falar dele! “

. Não tendo tido concretização, este projecto havia que prosseguir as investigações, a partir da superfície, nesta Faixa Magnetítica e Zincífera, com aplicação das técnicas geofísicas e geoquímicas, nas quais o Serviço de Prospecção, por mim dirigido, vinha adquirindo larga experiência.

Foi assim que se fizeram as descobertas dos jazigos de Algares de Portel e de Vale de Pães e se confirmou que ocorrências de minérios de ferro, tais como Vale do Vargo e outras dos arredores de Moura eram afinal chapéus de ferro de jazidas de sulfuretos.

Registo que Goinhas não alude, na sua história, a estes importantes factos, esquecendo-se até de citar, na bibliografia, a Comunicação que apresentei nas Jornadas de Engenharia de Moçambique, em 1965, sobre a notável descoberta de Algares de Portel, a qual foi publicada pela Sociedade de Estudos daquela ex-província ultramarina portuguesa.

A prioridade que era dada aos estudos na Faixa Piritosa, perante os espectaculares resultados que vínhamos obtendo, originava progressos mais lentos, na Faixa Magnetítica e Zincífera.

Impunha-se prosseguir, nessa Faixa, sobretudo, com as campanhas de gravimetria.

A 1.ª Brigada de Prospecção estava organizada para esse efeito.

Mas, em Janeiro de 1975, conforme descrevi nos posts N.ºs 81 até 91, os Engenheiros, os Geólogos, os Agentes Técnicos de Engenharia, e outro pessoal contratado, ao qual eu tinha dado formação técnica, ou promovido que fosse especializado na prática dos diversos métodos de prospecção, decidiram solicitar a minha demissão da chefia da 1.ª Brigada de Prospecção, que tinha sido pacientemente por mim organizada, ao longo de muitos anos.
Tomaram esta atitude de prescindir da minha orientação superior, obedecendo a instruções de dirigentes malévolos, que tentavam, a todo o custo, manter-se nos cargos a que tinham ascendido, no regime político anterior à Revolução de Abril de 1974, não por competência, mas por considerações de ordem político-religiosa (Ver post N.º 25)

Nestas circunstâncias, deixei de ter conhecimento do progresso dois estudos na Faixa Magnetítica e Zincífera.

Sabia apenas que, tendo-me acusado de ter ocasionado enormes prejuízos ao País, o Geólogo Delfim de Carvalho, que passara a assumir-se como principal dirigente da Brigada, declarou publicamente que, com a minha demissão da chefia da Brigada, “nada parou, tudo continuou”!!!. (Ver post N.º 101)

Isto induziria a pensar que continuavam os prejuízos, … ou então, se tudo continuava a correr bem, que eles a si próprios se classificavam de traidores.

O facto era que a Brigada estava organizada, com os seus diferentes núcleos, actuando por todo o Alentejo e, até por “inércia de movimento”, teria de manter-se activa, seguindo ou não os planos que eu traçara.

Mas o que chegava ao meu conhecimento não era animador.
A Brigada que eu pacientemente organizara, durante anos, estava a desintegrar-se.
O Geólogo Delfim de Carvalho, apesar do caloroso empenho que quis manifestar pelo progresso da Brigada, logo que pôde, abandonou-a para ocupar a chefia dos Serviços Geológicos.
E o Engenheiro Vítor Borralho, outro dos principais autores do vergonhoso documento que conduziu à minha demissão da chefia da Brigada, conseguiu ser nomeado Administrador de Minas de Aljustrel.
E o próprio Goinhas acabaria por sair para dirigir o Gabinete para a Prospecção e Pesquisa de Petróleo !!!

Já me tinha surpreendido o comentário depreciativo de Jorge Gouveia, quando ocupou o cargo de Director do SFM, ao informar-me de que, no Sul, andavam a inventar trabalho.
Queria significar que faziam cobertura de áreas por técnicas geofísicas, apenas para manter activo o seu excessivo pessoal, de cuja admissão me culpava.
A minha reacção foi, então de que, quando estiveram sob minha chefia, não conseguiam realizar senão uma parcela mínima do que eu projectava. (Ver post N.º 134).

Mas a qualidade que passaram a ter os estudos na 1.ª Brigada de Prospecção ficou bem patente em diversos documentos publicados.

Já me referi ao caso do Salgadinho, que Delfim de Carvalho promoveu a jazigo, colocando-o em paralelo com Neves – Corvo e que não passa, por enquanto, de um bom indício da ocorrência de calcopirite, para cuja descoberta Delfim de Carvalho além de nada ter contribuído, passou a investigar de modo muito incorrecto, com enorme desperdício de dinheiros públicos.

A outros casos semelhantes me referirei oportunamente.

No próximo post, revelarei a decisão que fui compelido a tomar, após a leitura do artigo da autoria dos Geólogos José Goinhas e Luís Martins, publicado em 1986, no Tomo 28 da Revista do SFM, com o titulo:
“Área metalífera de Montemor o Novo. Um exemplo da evolução dos objectivos em prospecção mineira”.

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